A gente se acostuma com o garoto pedindo esmola na
rua. E, porque está acostumado, a rotina faz com que nem o note mais. E, porque
não nota esquece a sensibilidade. E, porque não existe mais o que toca o
coração, perde a humildade.
A gente se acostuma a sorrir para não transparecer a
dor. E, porque sorri sem estar feliz, já não sabe mais qual o sabor de um
sorriso verdadeiro. E, porque não lembra como é bom senti-lo, esquece de
cativá-lo em outras pessoas. E, esquece de fazer feliz e sentir-se
verdadeiramente feliz.
A gente se acostuma de tanto ouvir essas campanhas de
agasalho feitas no inverno. E por se acostumar, a gente nem liga mais, o
cérebro entra em seu estado automático e nem reconhecemos mais o que significa.
E por não notar seu sentido, acabamos por fechar os ouvidos para o “ajudar ao
próximo”.
A gente se acostuma por hábito, porque nos acomodamos
demais para mudar. E, porque nos acomodamos não vivemos, apenas estamos vivos.
E, porque não vivemos, morremos como flores de plástico que nunca exalam
perfume algum.
A gente se acostuma a ouvir a chuva sem decifrá-la. E
por não ouvi-la em suas mais variadas sincronias de sons perdemos a
sensibilidade. E por perder a sensibilidade não notamos nem as pessoas à nossa
volta. E por não notar as pessoas, vivemos indiretamente solitários. E por
viver dentro de sua solidão nos tornamos egoístas demais para notar o mundo.
A gente se acostuma a ler o jornal e ao fechá-lo não
mudar nada em sua forma de pensar. E por não adquirir nenhuma mudança, já não
existe mais motivos para ler. E por não ter motivos para ler, os livros são
esquecidos. E por esquecê-los é deixado de lado todo o conhecimento escondido
por entre as páginas fechadas. E por deixar de lado conhecimentos ricos, é
mantida a intelectualidade em estados precários, de forma que, este é o
fundamental para o crescimento na vida de todos.
A gente se acostuma a viver atrás do computador. E
por se acostumar, esquecemos como é sair para conversar. E porque não é mais
preciso sair para manter contato com as pessoas, acabamos por manter-se em um
ciclo monótono. E por seguir constantemente neste mesmo ciclo, é esquecido o
quanto é valioso um contato pessoal com os amigos.
A gente se acostuma a ouvir as mesmas músicas. E por
ouvir sempre as mesmas deixamos de conhecer músicas novas. E por não conhecer
novos artistas, deixamos de conhecer novas culturas. E por não conhecermos
novas culturas, nos conformamos com o pouco que conhecemos. E por se conformar com
este pouco, criticamos aquilo que nem sequer conhecemos.
Eu
sei que a gente vive em uma vida feita de costumes. Mas não devia.